sábado, 29 de maio de 2010
"A Teta Assustada" faz crítica social através de mito peruano
Quem se depara pela primeira vez com o cartaz e o nome do filme, escrito e dirigido por Claudia Llosa, pode imaginar que se trata de uma comédia de costumes. Afinal, tantas cores aliadas a esse nome inusitado não poderiam remeter a outra coisa. Muito pelo contrário. A Teta Assustada traz uma temática um tanto quanto pesada, tomando como gancho o mito peruano de mesmo nome.
O filme conta a trajetória de Fausta, tímida garota de origens quechuas que vive na periferia de Lima, a partir da morte de sua mãe. Esta havia sido estuprada, grávida, por terroristas que atormentaram a vida dos habitantes de áreas rurais do Peru na década de oitenta, tendo passado a doença da teta assustada para a filha através do leite materno.
Segundo crenças locais, os portadores de tal doença psicológica acabam tendo que conviver pelo resto de suas vidas com o constante medo de ser violentados. Devido a esse medo, Fausta mal fala, jamais sai de casa desacompanhada e não tem relações próximas com ninguém, nem mesmo com a família de seu tio, seus parentes mais próximos. Para evitar um possível estupro, a moça pensa numa solução inusitada: introduz uma batata em sua vagina, pois, segundo sua mãe, essa era a única forma de espantar os homens de más intenções, através do nojo que sentiriam ao ver o legume.
No entanto, após a morte da mãe, a índia se vê obrigada a abandonar o casulo em que se manteve durante todos esses anos. Para realizar o enterro em sua terra de origem, precisa de dinheiro e, para arrumar esse dinheiro, precisa trabalhar. Assim, ela acaba arrumando um emprego de meio período, como empregada na casa de uma rica pianista de traços europeus, que oferece a ela pérolas em troca de inspiração para seu próximo concerto. Porém, a patroa não cumpre com sua parte do trato. A diretora embute aí uma crítica à relação entre a elite branca e os indígenas, em que os nativos abrem mão de terras e favores, sem ganhar nada em troca.
Pode-se dizer, aliás, que o filme todo é uma metáfora do retrato das sociedades latino-americanas atuais. Fausta seria a simbolização da cultura ancestral quechua, sendo oprimida pela imposição dos modos europeus. O limite entre os dois mundos pode ser representado pelo pesado portão da casa da pianista.
Enfim, o longa-metragem trata da libertação e da superação dos obstáculos da personagem central, que se inicia quando esta começa a dar confiança ao jardineiro da casa onde trabalha.
Claudia Llosa soube contrapôr muito bem o peso e a delicadeza do drama central com pinceladas de humor, presentes principalmente nas cenas dos casamentos organizados pela família do tio da protagonista.
Objetivos da diretora à parte, o longa não deixa de ser um retrato da vida nas periferias peruanas nos dias de hoje, destruindo a imagem pré-formada que temos de um Peru feito apenas de Macchu Picchu e dos incas.
Ótimo para quem gosta de filmes mais na linha cult, mas, se está em busca de entretenimento, talvez seja melhor deixar para outro dia.
Na dúvida, confira o trailer:
Ouça, também, a versão em áudio da resenha do filme:
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